Quando falamos em desenvolvimento motor, referimo-nos às mudanças que ocorrem no comportamento motor ao longo da vida. Isso abrange tanto o desenvolvimento quanto a aprendizagem de habilidades motoras ao longo do tempo. Essas habilidades podem ser adquiridas ou aprendidas à medida que os anos passam.
Um bebê de seis meses adquire a habilidade de se sentar devido ao processo maturacional alcançado nessa idade. Já aos cinco anos, habilidades como chutar, arremessar e saltar podem ser ensinadas e aprimoradas através da prática. Por exemplo, um bebê de seis meses precisa primeiro estabilizar a coluna até a altura da cintura para conseguir sentar-se sem apoio. A locomoção, como engatinhar e caminhar, não ocorre ainda porque os membros inferiores não alcançaram maturidade suficiente para fornecer a estabilização necessária para a locomoção. Entretanto, o bebê começa a manipular objetos de forma consciente e rudimentar com as mãos, pois seus membros superiores já atingiram a maturidade necessária para isso. Em contrapartida, uma criança mais velha possui uma melhor estabilidade, permitindo-lhe aprender habilidades motoras mais complexas de locomoção e manipulação de objetos.
A partir desses exemplos, podemos identificar que as habilidades motoras, ao longo da vida, podem ser caracterizadas por três aspectos: estabilização, locomoção e manipulação. Sentar-se aos seis meses de idade envolve apenas estabilização, enquanto segurar um objeto envolve tanto estabilização quanto manipulação. Por outro lado, uma criança de cinco anos, ao arremessar uma bola parada, precisa estabilizar-se e manipular a bola. Se essa criança arremessar a bola enquanto caminha pela quadra, essa habilidade incluirá estabilização, manipulação e locomoção.
Como ocorre o desenvolvimento dessas características das habilidades motoras? É o que abordaremos nesta aula.
Desenvolvimento da Estabilização
A estabilização é a mais simples e fundamental das habilidades motoras, pois envolve o controle da musculatura contra a gravidade. Seu desempenho é muitas vezes simples, mas essencial para a execução de outras habilidades. A estabilização inclui habilidades como ficar de pé, sentar-se, equilibrar-se em um pé só, realizar inversões (como a parada de mãos) e agachar, entre outras. Para o desenvolvimento de um repertório robusto de habilidades motoras, é necessário o amadurecimento da estabilização para sustentar o movimento principal.
Para entender melhor, é importante lembrar que grande parte do desenvolvimento do sistema nervoso ocorre após o nascimento, seguindo uma direção que vai da cabeça aos pés (cefalocaudal) e do centro do corpo para as extremidades (proximodistal). Assim, a estabilização começa pela cabeça, seguida pelo pescoço, tronco, pernas e pés (cefalocaudal). À medida que o tronco se estabiliza, a criança desenvolve a capacidade de estabilizar os braços, depois os antebraços, mãos e dedos (proximodistal). Com a estabilização em progresso, os movimentos de manipulação e locomoção também começam a se desenvolver. No entanto, é essencial que a estabilização ocorra primeiro.
Assim, quando o pescoço e o tronco são estabilizados, a criança é capaz de sentar-se sem apoio. Quando a parte superior das pernas (coxa) se estabiliza, a criança pode inclinar o tronco para frente para engatinhar. Nesse ponto, os braços já são suficientemente desenvolvidos para fornecer estabilização durante o engatinhar. Quando a parte inferior das pernas amadurece, a criança pode ficar de pé, o que posteriormente permite o início da marcha.
Alguns autores sugerem que exista uma sequência previsível de comportamentos motores, denominados marcos motores (SHUMWAY-COOK; WOOLACOTT, 2003). Esses marcos motores são comuns na maioria das crianças e acontecem dentro de uma faixa etária, como mostra a figura 1.
Figura 1: Os marcos motores que surgem com a estabilização. Com 2 meses, a estabilização de cabeça e pescoço permite o rastejar. Entre 6 e 7 meses, a estabilização do tronco permite o sentar-se, entre 8 e 10 meses, a estabilização de porção superior de coxa, permite o engatinhar, entre 9 e 10 meses, a estabilização de membros inferiores, permite o ficar em pé com apoio, entre 12 e 13 meses, o ficar em pé independente e entre 14 e 18 meses, o caminhar. Fonte: adaptado de Shumway-Cook; Woolacott, 2013, imagens: www.pexel.com.
O desenvolvimento de cada habilidade ocorre através do processo de maturação da criança e envolve também a aprendizagem da coordenação das informações sensório-motoras. Por exemplo, quando a criança começa a se sentar sem apoio, ela aprende a coordenar as informações sensório-motoras relacionadas à cabeça e ao tronco, ou seja, a criança adquire o controle da inclinação espontânea do corpo, o que contribui para que ela se mantenha ereta.
Desenvolvimento da Locomoção A locomoção pode ser definida como o ato ou a capacidade de se mover de um lugar para outro (HAYWOOD; GRETCHELL, 2010). As primeiras formas de locomoção começam com o rastejar, seguido pelo engatinhar, e eventualmente evoluem para a caminhada. Posteriormente, a locomoção pode avançar para a corrida, o galope e os saltos, dependendo das restrições impostas pelo indivíduo, pelo ambiente e pela tarefa.
Figura 2: Os primeiros passos da criança são marcados por uma pequena extensão das pernas e quadril, a pisada é com o pé chapado e afastados um do outro sem rotação de tronco. Os braços ficam levantados em guarda alta. Imagem: www.pexel.com
Ao longo da vida, a maioria das pessoas mantém uma sincronia fundamental no ato de caminhar, que consiste na alternância das pernas. Isso ocorre de modo que a perna direita esteja no meio do seu movimento quando a perna esquerda começa o seu, com um período em que ambas as pernas estão em contato com o solo, seguido de uma fase de apoio unilateral. Essa organização temporal relativa tende a permanecer estável ao longo da vida. No entanto, conforme o corpo ou o ambiente mudam, o tempo absoluto (a rapidez ou lentidão) e a altura ou o comprimento do passo podem variar.
Outra forma de locomoção que começa na infância é a corrida, que também envolve a alternância das pernas, mas inclui uma fase aérea, em que ambos os pés estão fora do solo. À medida que a criança cresce e se desenvolve, ela também adquire habilidades como saltitar, galopar, deslizar e realizar outros tipos de saltos. Essas formas de locomoção são amplamente utilizadas em brincadeiras e atividades. A criança, naturalmente, consegue transitar de uma corrida para um galope, por exemplo. No entanto, a capacidade de desenvolver essas habilidades depende muito de suas características pessoais (restrições do indivíduo), como altura, peso, medo e motivação, bem como das condições do ambiente (espaço, tipo de solo, incentivo, características da prática).
Com o envelhecimento, as mudanças na locomoção não seguem um padrão como na infância, pois variam conforme fatores individuais, como lesões, alterações de peso, mudanças na força e no equilíbrio e o nível de condicionamento físico. Assim, os padrões de caminhada e corrida diferem de pessoa para pessoa. Além disso, os adultos tendem a abandonar formas de locomoção como o galope e o deslizar em suas atividades diárias, reservando essas habilidades para contextos específicos, como na dança.
Desenvolvimento da Manipulação
As habilidades de manipulação envolvem a aplicação de forças em objetos. O bebê inicia suas atividades manipulativas com habilidades básicas, como alcançar, pegar e soltar. Ao nascer, o bebê é capaz de segurar objetos, mas esse movimento é reflexo, ou seja, involuntário. A atividade de alcançar voluntariamente começa por volta dos quatro meses de vida, quando o bebê consegue fazer contato com o objeto através de ajustes mais precisos dos olhos e das mãos. Esses movimentos começam lentos e desajeitados, envolvendo os ombros e cotovelos. Por volta do quinto mês, a criança já é capaz de alcançar o objeto e fazer contato tátil com ele. A habilidade de alcançar é desenvolvida antes de a criança conseguir pegar o objeto, ou seja, segurá-lo com a mão. Assim, depois de desenvolver a habilidade de alcance, a criança consegue pegar o objeto com a mão inteira, embora sem muita firmeza. Por volta do sétimo mês, a palma da mão e os dedos tornam-se mais coordenados. Contudo, a pegada que envolve o polegar e os outros dedos só se desenvolve por volta do décimo segundo mês.
Embora uma criança de cinco meses consiga alcançar e pegar um objeto, ela ainda não aprendeu a soltar, pois não possui maturidade para relaxar os flexores dos dedos. A habilidade de soltar objetos é geralmente dominada por volta dos 14 meses, e aos 18 meses a criança já possui um controle bem coordenado de alcançar, pegar e soltar.
Figura 3: No quadro 1, o bebê já adquiriu a habilidade de alcançar um objeto. No quadro 2, o bebê já pega o objeto. O soltar acontece um pouco depois, por volta dos 14 meses. Imagens: www.pexel.com
Conforme a criança vai crescendo e amadurecendo, ela vai desenvolvendo outros tipos de habilidades manipulativas, muitas delas envolvem o controle de bola como: arremessar por sobre o ombro, chutar, rebater, driblar uma bola e lançar por baixo. Essas habilidades entram na lista de habilidades motoras fundamentais que são melhor desenvolvidas na infância para depois serem utilizadas em atividades esportivas e práticas de exercício físico (figura 4).
Figura 4: Habilidades manipulativas de controle de bola. Imagens: www.pexel.com.
O desenvolvimento das habilidades de estabilização, locomoção e manipulação são influenciados pela maturação e pelo aprendizado. Além disso, as restrições do próprio indivíduo, da tarefa e do ambiente podem influenciar de maneira positiva, sendo um fator encorajador/facilitador; ou de maneira negativa, sendo um fator desencorajador/dificultador.
GALLAHUE, David; OZMUN, John; GOODWAY, Jacqueline. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. Porto Alegre: AMGH, 2013.
HAYWOOD, Kathleen; GETCHEL, Nancy. Desenvolvimento motor ao longo da vida. Porto Alegre: Artmed, 2010.
SHUMWAY-COOK, Anne; WOOLLACOTT, Marjorie. Controle motor: teoria e aplicações práticas. Barueri: Manole, 2003